A sociedade paulistana clama por RESPEITO nas ruas - será a hora da virada?
Fazia MUITO FRIO nas nove horas do domingo paulistano quando começaram a chegar os primeiros manifestantes para a passeata que tinha como slogan principal: BASTA DE PASSIVIDADE, É HORA DE AGIR! Eu mesma tentei fugir de todas as formas do convite gélido, mas a insistência de um amigo me fez ir arrastando-me até o Monumento das Bandeiras para a passeata rumo à Congonhas em apoio às vítimas do acidente da TAM - era tudo o que eu sabia sobre o evento.
Fazia MUITO FRIO nas nove horas do domingo paulistano quando começaram a chegar os primeiros manifestantes para a passeata que tinha como slogan principal: BASTA DE PASSIVIDADE, É HORA DE AGIR! Eu mesma tentei fugir de todas as formas do convite gélido, mas a insistência de um amigo me fez ir arrastando-me até o Monumento das Bandeiras para a passeata rumo à Congonhas em apoio às vítimas do acidente da TAM - era tudo o que eu sabia sobre o evento.
O primeiro grito que ouvi ecoava RESPEITO de algumas centenas de pessoas frente ao carro de som. Algumas bandeiras do PSDB na esquina e eu logo pensei tratar-se de um evento eleitoreiro. Era algo bem organizado, chamava atenção ver tantas pessoas bem vestidas, uma grande maioria de preto com muitos gorros e cachecóis para se aguentar o frio. Logo apareceram nas pessoas narizes vermelhos de palhaço (distribuídos pela organização do evento) como quem diz assim: não sou palhaço! Coloquei um nariz de palhaço e fui caminhando por entre a variedade de pessoas do entorno. Havia um grupo de judeus da Associação Amisrael, gente abraçada na bandeira do Brasil, grupos de familiares e amigos de mortos do acidente carregando fotos, gente com jeito de quem veio passear no parque com o cachorro, casais de idade, crianças, jovens de periferia - uma variedade de pessoas nesta atípica manhã paulistana.
Algumas questões rondava no ar: Há quanto tempo não se vê uma passeata de protesto na cidade? Quanto tempo não se vê uma passeata de protesto repleta de integrantes da classe média e classe média alta paulistana? Nem tenho tanto tempo de vida para saber a quanto tempo isso não ocorre!
Logo logo o desenho político (ou não-político) do evento foi se desenhando. Antes mesmo do arranque da passeata ouviu-se gritos no final da aglomeração: “FORA, FORA, FORA!” - corri até o local para ver os militantes do PSDB sendo escurraçados pelos manifestantes. A organização do evento logo anunciava “Este não é um evento político partidário e não admitiremos esse tipo de associação.” Os manifestantes vibraram, aplaudiam! E que manifestantes exigentes - bons paulistanos! Na demora em se iniciar a caminhada em meio ao frio de 7 graus centigrados os manifestantes também exigiam em voz alta: “ANDA! ANDA!” - é assim a passeata paulistana! Rumamos então a Congonhas!!
Muitas pessoas discursaram do alto do carro de som: líderes desconhecidos, familiares de vítimas, de famoso mesmo só o Seu Jorge, o cantor carioca, que não sei se perdeu alguém no vôo ou só se empolgou com a causa, só sei que contribui muito com seu linguajar claro e sua bela canção. A mensagem que emitia de todos era muito clara: demandava-se RESPEITO e demandava-se o BÁSICO. Interessante que o tema do acidente da TAM foi extrapolado logo no início do evento demonstrando que a preocupação do grupo era em relação a não só esta como a tantas OUTRAS MORTES ANUNCIADAS com as quais convivemos todos os dias, decorrentes de pobreza, assaltos, saúde pública précária etc.
Me deparei com um protestante que carregava um cartaz escrito a mão que dizia tudo: BASTA DE GANÂNCIA, CORRUPÇÃO, INCOMPETÊNCIA E IRRESPONSABILIDADE. Quando li estas palavras me surpreendi com a precisão de sua seleção e logo vi muitas pessoas se aproximando dele para elogiar-lo: “É exatamente isso!”, “Esta é a minha chapa”, “Parabéns pelo cartaz!” - todos concordavam co ele. É verdade que ouviu-se muitos “Fora Lula!”, muitos “Fora Marta”, mas ouviu-se também um apelo pela renúncia de Renan Calheiros e outros membros do legislativo brasileiro, de modo que eu interpretei que este foi um protesto de descontentamento generalizado com o Governo, não uma oposição partidária ao Partido dos Trabalhadores. Mais do que tudo era uma expressão de desespero.
Sobre desespero, notei que muitas pessoas ali buscavam alívio para isto que sentiam. Conversei com uma senhora de seus 60 anos que deixou o marido e os filhos em casa e veio para a passeata com um cartaz em mãos que dizia: “CHEGA! IMPUNIDADE E CORRUPÇÃO”. Disse-me ela que há anos que sente-se revoltada com a situação do país, que já parou de assitir TV, que mal dorme com medo quando seus filhos saem à noite e nunca fez nada mas que “HOJE RESOLVI FAZER ALGO!” Uma moça jovem e bonita, empresária de sucesso, carregava flores em punho e emocionada dizia “EU SOU O CHE GUEVARA, MAS NÃO HÁ NUNCA ESPAÇO PARA FAZER ALGO!” As tampas hoje estouraram!
Quando descíamos a Avenida 23 de Maio olhavamos para trás e que surpresa - haviam MILHARES DE PESSOAS nos seguindo! Ouvi falar em 6.000 pessoas participando e digo-lhes que com o frio que fazia na cidade essas 6.000 certamente valiam por no mínimo 30.000 - eu mesma conheço 5 pessoas que teríam ido se não fosse o fator climático!
Chegando na frente do local do acidente o grupo prestou suas homenagens aos mortos. Os repórteres faziam seu trabalho e eu vi os organizadores vibrando com o resultado do evento - em somente uma semana esse grupo relativamente icógnita, que aparentemente não buscava voto de ninguém (ou se buscava, não anotei seus nomes e nem sei para qual eleição!), conseguiu fazer acontecer. Acho que eles, como todos nós manifestantes, estavam um pouco MISTIFICADOS com as razões que levaram este evento à gerar tanta mobilização popular.
Seria este um evento isolado? Talvez sim e talvez não? Ao final ouvia-se várias pessoas falando em mantermos este grupo, em fazermos algo, em nos unirmos e buscarmos mudanças. Se hoje nasceu aqui em Sampa algo novo o tempo dirá. Na minha opinião isto ainda não acontecerá pois este grupo, assim como a MÍDIA brasileira, AINDA SE MOBILIZA EXCLUSIVAMENTE EM TORNO DA INDIGNAÇÃO com os fatos. Sem minimizar esta vitória intermediária de expressão da indignação, é preciso se reconhecer que infelizmente não há ainda mobilização em torno de um projeto novo de futuro para o Brasil. Como foi dito durante a passeata A LUTA AQUI É AINDA PELO BÁSICO, luta para não se morrer um dia qualquer num acidente banal. A passeata de hoje foi um grande pequeno passo - que o futuro se dê daqui para diante!
Julho 2007